Assim falou Miracleman

Miracle Man #9

Foi finalmente publicado em Agosto um dos comics mais antecipados por quem se interessa por questões como a censura ou os processos de reedição de material controverso, quer pelo seu conteúdo, quer pela sua importância histórica. Estou-me a referir a Miracleman #9, onde Scenes From the Nativity, escrita por Alan Moore (identificado como The Original Writer, a pedido do autor), desenhada por Rick Veitch e arte-finalizada por Rick Bryant, é reeditada pela Marvel Comics com novas cores e nova legendagem.

Miracle Man #9

Como o nome indicia, neste capítulo, após a “batalha final” com Gargunza (têm mesmo de ler os números anteriores), assistimos literalmente ao nascimento de Winter, a filha de Marvelma… desculpem, Miracleman e Liz Moran, e por ser uma sequência criada sem compromissos e por isso visualmente honesta, esta edição foi alvo de diversos avisos aos retalhistas quanto ao seu conteúdo e que iam subindo de tom à medida que as semanas passavam: de Parental Advisory a Mature (MR) acabando em “Please note that the upcoming Miracleman #9 contains graphic content, including a detailed scene of childbirth”. Com receio que tantas precauções fossem insuficientes, a editora distribuiu o referido número dentro de um saco plástico para evitar que leitores menos avisados e mais sensíveis, apenas habituados a ver sangue associado à morte, o vissem associado à vida.

Mas antes de prosseguir vale a pena fazer aqui um breve resumo do percurso conturbado da série Marvelman/Miracleman e das longas disputas legais que opuseram os seus criadores e editores.

Marvelman foi criado em 1954 por Mick Anglo para o editor inglês L. Miller & Son quando este foi obrigado a descontinuar o seu título mais vendido, Captain Marvel, devido à conhecida acção judicial da DC Comics contra a Fawcett Comics, onde esta era acusada de plagiar o Superman. Depois de 13 anos de disputa em tribunal a Fawcett foi obrigada a parar de publicar Captain Marvel, resultando na sua dissolução como editora de comics. Len Miller que republicava estas aventuras a preto e branco no Reino Unido pediu a Mick Anglo que com o seu estúdio criasse um herói suficientemente parecido e desse continuidade ao título. Assim nasceu Marvelman, cujo alter ego era Micky Moran, um jovem repórter que ao dizer Kimota — foneticamente é a palavra Atomic pronunciada ao contrário — se transforma no übermensch. Para replicar o conceito de família em Captain Marvel, foi criado Dicky Dauntless um adolescente que se transformava em Young Marvelman, e o jovem Johnny Bates, o Kid Marvelman, tendo ambos Marvelman como palavra “mágica” que despoletava a transformação.

As aventuras da família Marvelman continuaram com diversos graus de sucesso comercial até 1963, ano em que começaram a ser importados em massa os comics a cores dos EUA. No entanto, já em 1960 Mick Anglo tinha-se dissociado da L. Miller & Son e decidido reciclar e publicar algumas das suas histórias e, apesar de sempre ter reclamado direitos autorias sobre o Marvelman, renomeou o herói para… Captain Miracle.

Avançamos para 1982 e entra Alan Moore com uma questão pertinente e até então inédita: Como seria alterada a nossa realidade se os super-herois realmente existissem? Moore recriou Mike Moran, agora um homem de meia-idade, casado, envelhecido, a viver na socialmente depressiva Inglaterra de Margaret Thatcher (“personagem” que irá estar bem presente na obra de Moore, explicitamente em V for Vendetta, série criada na mesma época, e implicitamente em From Hell) e sem memória do seu passado heróico.

Originalmente publicada em capítulos a preto e branco, com arte de Garry Leach, Alan Davis e John Ridgeway, na excelente revista Warrior, a antologia editada por Dez Skinn (um antigo editor da Marvel UK) a série viu o seu nome alterado, contra a vontade de Moore, para Miracleman devido a pressões judiciais da Marvel (Machiavelli ficaria orgulhoso). Miracleman seria então publicada a cores pela Eclipse Comics a partir de 1985, tornando-se numa série de culto com a arte de Chuck Beckum, Rick Veitch e principalmente de John Totleben. Na sua última fase (Miracleman #11 a #16, Book Three: Olympus), Moore cria algumas das mais violentas e sangrentas páginas publicadas nos comics até então, retratando a luta de Miracleman com um lunático Kid Miracleman nas ruas de Londres. No fim, Miracleman apenas encontra uma solução para evitar futuros massacres: Institui um regime totalitarista na Terra.

Neil Gaiman passou então a ser o argumentista a partir do número 17 e com Mark Buckingham criou uma ambiciosa história em três capítulos — The Golden Age, The Silver Age, The Dark Age — onde problematiza a existência de uma Utopia liderada por um único (super)ser. Mas com a falência da Eclipse, a série foi interrompida no número 24, no início do segundo capítulo, e dá-se o começo de uma série de batalhas jurídicas que durante anos irá opor Moore, Davis, Gaiman, Skinn e mais tarde Todd McFarlane, que entretanto tinha comprado o fundo de catálogo da Eclipse.

Avançamos para 2013 e na New York Comic-Con, Joe Quesada anunciou que a Marvel iria republicar a série original em 2014 e que Neil Gaiman iria finalmente continuar a sua história em colaboração com Mark Buckingham.

“I love the idea that I will get to finish this story”, referiu Gaiman numa entrevista à Marvel.Com, “The tragedy of Miracleman was that we published two issues, wrote three and a half – and then it all stopped. And Miracleman #25 has been sitting in the darkness – nobody has seen it. It was drawn, it was written, it was lettered over 20 years ago.”

A equipa da Marvel Special Projects tem trabalhado com os autores nestas reedições através da utilização das pranchas originais ou de provas de impressão e afirma que novas técnicas estão a ser usadas para assegurar um produto final de qualidade. Mas se a nova legendagem melhora o aspecto final das páginas já as cores aplicadas têm demasiados efeitos especiais, a nudez pontual de Liz Moran foi censurada com revisões na arte e até a palavra nigger, usada totalmente dentro do contexto, foi eliminada.

Miracle Man #9

Miracle Man #9

Apesar disto recomendo a leitura de Marvelman/Miracleman neste infeliz formato em “alta definição” tão-somente pelos extras que cada edição contém: Reprodução das páginas originais e capas, diversas notas de produção e reedição de histórias clássicas dos estúdios de Mick Anglo dos anos de 1950, ficando a faltar no entanto textos que contextualizem a série e a sua importância para a história dos comics deste que é sem dúvida um dos melhores trabalhos de Alan Moore, e entre os melhores de Neil Gaiman.


André Azevedo escreve habitualmente no blogue A Garagem.

Sugestões #53

Livraria Mundo Fantasma

Já a pensar no Natal, tenho mais uma série de sugestões para encher o sapatinho ou a peúga! A destacar Thanos Vs. Hulk por Jim Starlin, Angela: Asgard’s Assassin por Kieron Gillen, Phil Jimenez e companhia ambos na Marvel, Hellboy e BPRD por Mike Mignola, John Arcudi e Alex Maleev na Dark Horse, Bitch Planet por Kelly Sue DeConnick e Valentine De Landro na Image, Crosse: Plus 100 por Alan Moore e Gabriel Andrade na Avatar e Master Keaton por Naoki Urasawa na Viz. Aproveitem para visitar a livraria que está, como habitualmente, cheia de novidades e excelentes títulos para experimentar. Boas leituras!

Marvel para assinatura

Thanos Vs. Hulk #1 (de 4)

Por Jim Starlin. O Hulk é raptado pelo Pip o Troll e vendido ao Annihilus! E algures o Thanos é metido na confusão. Violência e acção! Muita violência e muita acção quando estes dois titãs se enfrentarem!

Angela: Asgard’s Assassin #1

Por Kieron Gillen, Marguerite Bennett, Phil Jimenez e Stephanie Hans. Toda a sua vida, Angela a maior guerreira de Heven, foi educada para odiar Asgard com todas as suas forças. Agora ela sabe a verdade das suas origens, ela é irmã de Thor, ela é asgardiana. Exilada do seu mundo e sem querer nada de Asgard, Angela tem de sobreviver sozinha. Mas o que é que Angela tem que tanto Asgard e Heven querem?

Shield #1

Por Mark Waid, Carlos Pacheco e Julian Totino Tedesco. O agente especial Phil Coulson reúne os melhores e mais inteligentes, os mais dotados e a élite, humanos e super-humanos do universo Marvel nas mais diversas missões para a SHIELD! Cada número, uma missão, cada número, uma aventura completa!

Spider-Man and the X-Men #1

Por Elliott Kalan e Marco Faill. Eis o novo professor e orientador da Jean Grey’s Academy, Spider-Man! O que faz um não mutante numa escola para mutantes? Qual é o motivo que levou à formação da sua turma especial? E o que fará Spider-Man no meio desta confusão?

All New Miracleman Annual #1

Por Grant Morrison, Peter Milligan, Joe Quesada e Mike Allred. Um perturbante confronto antes da batalha de Londres, narrada por Grant Morrison e ilustrada por Joe Quesada. E uma nova aventura de Miracleman pelo génio de Peter Milligan e Mike Allred.

DC

Superman: Earth One Vol. 03 HC

Por J. Michael Straczynski, Ardian Syaf e Sandra Hope. Quem salvará o Superman? Ele pode ser invulnerável, mas está também sozinho! Na sua curta carreira como herói, Clark Kent enfrentou os mais perigosos, mortíferos e monstruosos vilões do planeta. Mas a sua maior ameaça pode vir de dois humanos perfeitamente normais, que são duas das pessoas mais inteligentes da Terra! Eis Lex e Alexandra Luthor, que foram pagos para arranjar uma forma de anular os poderes do Superman e o homem que destruiu Krypton foi recebido pelos governos do mundo, para completar a sua missão, com o assassínio de Kal-El!

DC para assinatura

Wolf Moon #1 (de 6)

Por Cullen Bunn e Jeremy Haun. Quando a família de Dillon Chase foi massacrada por um lobo, a sua vida mudou para sempre. Dillon vai na caça da criatura, mas depressa ele descobre que a licantropia é mais insidiosa do que as lendas alguma vez disseram. Cada Lua cheia, ele está mais próximo do monstro, mas cada Lua cheia, ele apercebe-se que para deter o lobo, ele tem de matar o humano e transformar-se ele próprio no temível monstro.

Dark Horse para assinatura

Hellboy and the BPRD #1 (de 5)

Por Mike Mignola, John Arcudi e Alex Maleev. Uma série de homicídios bizarros e rumores levam o Professor Bruttenholm a enviar o jovem Hellboy na sua primeira missão a uma vila brasileira. Hellboy e um pequeno grupo de agentes descobrem algo terrível nas sombras duma fortaleza portuguesa do século XVI.

Image para assinatura

Bitch Planet #1

Por Kelly Sue DeConnick e Valentine De Landro. Bem-vindo a Bitch Planet, uma prisão de alta segurança num planeta inóspito, onde mulheres inocentes, ou culpadas são sujeitas a um inferno nesta série de ficção científica e “exploitation”.

Rumble #1

Por John Arcudi e James Harren. É assim: um espantalho entra num bar e começa estourar com tudo entre dois mundos. Após uma longa ausência, Rathrag, Sacrecrow Warrior God está de volta e infeliz. Más notícias para os seus inimigos, mas piores para toda a gente! Esta é uma aventura no mundo moderno, cheio de acção e fantasia onde bares do “piorio”, gatos zombie, skinheads psicóticos e múmias gigantes fazem parte do dia a dia.

Avatar para assinatura

Crossed: Plus 100 #1

Por Alan Moore e Gabriel Andrade. Passado 100 anos no futuro, Alan Moore cria um novo mundo e uma história cheia de um detalhe impressionante, onde civilizações são reconstruídas e gerações crescem sob condições extremas! A arquivista Future Taylor lidera uma equipa que trabalha na reconstituição dos eventos históricos da pandemia original Crossed. Ela viu-os em vídeos, mas nunca nenhum vivo com a doença, os Crossed são parte dum passado distante. Até que de repente um punhado aparece e o sangue começa a escorrer. Nada é o que parece neste horrível mistério pelas mão do génio de Alan Moore.

Viz

Master Keaton Vol. 01

Por Naoki Urasawa. Taichi Hiraga-Keaton é o filho dum zoologista japonês e duma nobre inglesa. Ele é um investigador de seguros, conhecido pelo seu sucesso e métodos pouco ortodoxos de investigação. Educado em arqueologia e ex-membro das SAS, Keaton usa os seus conhecimentos e o seu treino de combate para descobrir segredos enterrados, derrotar potenciais vilões e revelar a verdade!

Assassination Classroom Vol. 01

Por Yusei Matsui. Conheçam os potenciais assassinos da classe 3-E: Sugino, que deixou as suas notas afundarem e foi expulso da equipa de baseball. Karma que é um bom aluno, mas continua a ser suspenso por envolver-se em lutas e Okuda, que tem falta de aptidões académicas e sociais, mas é um génio em química. Quem tem a maior chance de ganhar a recompensa? Será o feito conseguido através de piedade, força bruta ou veneno? E quais as hipóteses do seu professor recuperar a sua auto-estima?