O título desta nova rubrica, “Estantes”, adequa-se bem à minha “biblioteca” de banda desenhada porque na realidade esta não existe como corpo único. Está espalhada em estantes de madeira no quarto e na sala e em estantes de metal na garagem, segundo ordens afectivas, de formato e do acaso. Edições alternativas e populares ou simplesmente estranhas convivem todas pacificamente umas com as outras, e estas com o resto dos livros de arte, literatura e afins, cd’s e discos em vinil.
Os comics e as revistas, que por conveniência de sequência numérica tendem a ficar juntos, são ainda os meus formatos favoritos para ler bd. Versam várias temáticas e provêm de diversas editoras, desde a canadiana Wee Bee à argentina Record, passando pela brasileira VHD, pelas portuguesas Portugal Press, Bertrand, Edibanda, Agência Portuguesa de Revistas, e um grande etc…
Contudo, nos últimos anos, o formato álbum começou a ganhar mais predominância pela necessidade do papel melhor, da edição cuidada e definitiva de uma determinada série, que replica em parte o apelo burguês que os velhos maoistas sentem com o passar do tempo. É disto exemplo a nova edição do Prince Valiant do Hal Foster pela Fantagraphics, a cores e em grande formato; ou as edições integrais, na versão original, de Bernard Prince, Mort Cinder de Oesterheld e Breccia ou L’Ile au trésor de Milani e Pratt, todas em capa dura.
Mas não é por já ter estas edições definitivas, cujos textos inclusos revelam novas perspectivas de leitura, que deixo de querer adquirir números do Tintin belga com capas do Vance ou os da Misterix argentina.
Na garagem encontra-se a maior parte da colecção, toda guardada em caixas transparentes de plástico com boa estabilidade térmica e sem a mínima preocupação com a estética do conjunto. Aqui a organização é necessariamente mais rígida e as caixas estão separadas por revistas, álbuns e comics, e dentro destas categorias, tal como nas estantes de casa, por tamanhos para que os danos físicos, inevitáveis com o tempo, sejam menores.
Falta organizar uma dezena de caixas onde todas as categorias se misturam e onde se acumulam títulos já lidos mas ainda não arrumados, os que ainda esperam leitura ou os que estão separados por já serem edições que deixaram de fazer falta na colecção: números repetidos ou versões brasileiras, espanholas e portuguesas de comics.
E é assim, em traços muito largos, que está guardada/organizada a minha colecção de banda desenhada, sempre com o apoio de indispensáveis e intermináveis listas de números adquiridos e por adquirir, ainda e sempre redigidas à mão em pequenos e práticos cadernos quadriculados que vão comigo para quase todo o lado.
André Azevedo escreve habitualmente no blogue A Garagem.
Em mês de mundial, em vez de vitórias morais apresento uma lista de selecções que para animar o espírito de qualquer adepto de BD. A destacar Guardians of the Galaxy Annual #1 por Brian Michael Bendis e Frank Cho na Marvel, Loverboys HC por Gilbert Hernandez na Dark Horse, Fade Out #1 por Ed Brubaker e Sean Phillips na Image, Collector HC por Sergio Toppi na Boom! e Heroic Legend of Arlan por Yoshiki Tanaka e Hiromu Arakawa na Kodansha. Aproveitem para passar na livraria para descobrir as novidades deste mês que ainda por aqui andam e preparar a selecção ideal de BD para levar para as férias. Boas leituras!
Marvel para assinatura
Superior Spider-Man #32
Por Dan Slott, Christos N. Gage, Giuseppe Camuncoli e Adam Kubert. O caminho para o Spider-Verse começa aqui! Num número especial, que inclui uma aventura ilustrada pelo incrível Adam Kubert, como é que o Superior Spider-Man está em acção? O que é que ele está fazer? Onde ele está? E mais importante, em que época ele está?
Guardians of the Galaxy Annual #1
Por Brian Michael Bendis e Frank Cho. A maioria dos dias no espaço não são o que se pode chamar de normal, mas hoje tudo está perfeitamente “normal”. Isto é, até um helicarrier da SHIELD aparecer de repente no espaço! Há alturas, em que se tem de ir fora da sua jurisdição para resolver os problemas, mas isto é um exagero! E no meio da confusão temos Peter Quill, ou Star-Lord para os amigos e a gangue do costume, os notórios Guardians of the Galaxy! Que as explosões comecem!
Wolverine Annual #1
Por Elliott Kalan e Jonathan Marks. Uma simples viagem pai, filha adoptiva com o seu respectivo filho adoptivo. Wolverine e Jubilee levam Shogo para férias no campismo. Mas como temos o Wolverine no meio da floresta, o que pode correr mal? Talvez tudo! O prenúncio da mini-série Death of Wolverine é aqui.
DC para assinatura
Multiversity #1
Por Grant Morrison, Ivan Reis e Joe Prado. Eis as 52 Terras alternativas do Multiverso da DC! Preparem-se para conhecer a Vampire League da Terra-43, os Justice Riders da Terra-18, Superdemon, Doc Fate, os super-filhos de Superman e Batman, os devastadores Retaliators da Terra-8, os Atomic Knights of Justice, Dino-Cop, Sister Miracle, Lady Quark, a Legion of Sivanas, os Nazi New Reichsmen da Terra-10 e o mais recente e maior super-heroi da primeira Terra: Tu!
Consistindo de seis aventura completas, cada uma passada num diferente universo paralelo, mais uma história em duas partes para estabelecer o enredo e um guia para os diferentes mundos do Multiverso. No primeiro número, o President Superman da Terra-23 descobre uma ameaça para toda a realidade, tão apocalíptica que será necessário uma equipa de heróis de todo o Multiverse para o enfrentar! Mas com uma variedade de Terras alternativas por onde escolher, onde qualquer variação é possível, pode alguém ter a esperança de resistir contra o ataque devastador do mal definitivo e do ódio eterno na forma de um ex-defensor cósmico com poderes inimagináveis?
Dark Horse
Loverboys HC
Por Gilbert Hernandez. Na cidade de Lagrimas, ao estilo da pequena cidade de Palomar, um jovem “loverboy” tem uma tórrida relação com uma mulher, que foi em tempos a sua professora do sétimo ano, enquanto três jovens raparigas conspiram para envenenar a população da cidade.
Uma história de paixão no estilo do inconfundível Gilbert Hernandez.
Dark Horse para assinatura
Pop #1 (de 4)
Por Curt Pires e Jason Copland. E se as estrelas pop e as celebridades mundiais fossem literalmente produtos, criados pelas mais ricas e as mais depravadas mentes do mundo? E se uma dessas estrelas conseguisse escapar?
Usagi Yojimbo: Senso #1 (de 6)
Por Stan Sakai. Vinte anos no seu futuro, Miyamoto Usagi luta como general pelo Lorde Noriyuki contra o terrível e traiçoeiro Lorde Hikiji. Na fúria da batalha final, um foguete de metal despenha-se e dentro está um inimigo que nenhum lado poderia imaginar. Testemunhem o destino final de Usagi Yojimbo e companhia, neste épico samurai com um surpreendente twist de ficção-científica.
Image
Displaced Persons
Por Derek McCulloch e Anthony Peruzzo. São Francisco, século XX, em 1939, um detective privado procura um herdeira desaparecida. Em 1969 dois irmãos gémeos encaram um roubo de drogas de lados opostos da lei. Em 1999, uma mulher lentamente se apercebe do terrível perigo que tem em casa. O que há de comum com estas pessoas? Um pouco de crime, homicídio, amor, amizade, traição e viagens no tempo!
Image para assinatura
Fade Out #1
Por Ed Brubaker, Sean Phillips e Elizabeth Breitweiser. Hollywood, 1948, um filme noir está preso em infindáveis filmagens. Um escritor amaldiçoado com pesadelos da guerra e um perigo secreto. A morte suspeita de uma estrela em ascensão. E um maníaco dono de um estúdio e o seu chefe de segurança fazem o que for necessário para manter as câmeras a rolar antes que os dias do bom pós-guerra terminem.
Wayward #1
Por Jim Zub, Steve Cummings and John Rauch. Rori Lane está a tentar iniciar uma nova vida, quando ela se reúne com a sua mãe no Japão. Mas criaturas antigas escondidas nas sombras de Tóquio sentem algo escondido, ameaçando tudo que ela adora.
Será que Lori consegue desvendar os segredos do seu poder, antes que seja tarde demais?
Avatar para assinatura
In the House of the Worm #1
Por George R. R. Martin, John Jos Miller e Ivan Rodriguez. Debaixo de uma cidade arruinada, num planeta esquecido, existe um mundo de intriga e vingança. Quando Annelyn é envergonhado, em frente dos seus amigos da nobreza, pelo Meatbringer, põe em andamento um plano de vingança. Mas a terrível verdade sobre o temível White Worm torna o seu plano em desgraça de forma catastrófica!
Boom! Studios
Collector HC
Por Sergio Toppi. Longe dos leilões da elite, o Collector procura raros e misteriosos artefactos de todo o mundo. Ele tanto está em casa nos salões de Paris, como nas selvas do Bornéu. Decorrido durante o colonialismo do século XIX, o Collector é uma aventura deliciosa de capa e espada.
Boom! Studios para assinatura
Fairy Quest: Outcast #1
Por Paul Jenkins e Humberto Ramos. As aventuras de Red e Mister Woof apenas começaram. Em Fablewood todas as histórias que foram alguma vez contadas, vivem lado a lado. Mas é um lugar maléfico, governado pelo terrível Mister Grimm e os seus asseclas da Think Police. Red e Woof querem escapar para um mundo onde a amizade não é proibida, mas nada os irá preparar para o que os aguarda na Dark Forest.
Drawn & Quarterly
Even More Bad Parenting Advice
Por Guy Delisle. A continuação das experiências de Guy Delisle no mundo das frustrações e alegrias de ser pai. A não perder!
Kodansha
Heroic Legend of Arslan Vol. 01
Por Yoshiki Tanaka e Hiromu Arakawa, o criador de Fullmetal Alchemist. Apoiado por apenas alguns companheiros, incluindo o filósofo/espadachim/estratéga Narsus e o seu jovem servo Elam, Pharangese, uma distante e fria sacerdotisa e Gieve um músico itinerante e vigarista, Arslan tem de sobreviver contra grandes desvantagens e juntar um exército forte o suficiente para libertar sua nação do exército de Lusitania, que é liderado pelo enigmático guerreiro conhecido como Silvermask!
Se já não é novidade haver desenhadores portugueses a desenhar para a Marvel, continua a ser notícia de cada vez que preparam um novo trabalho. O caso mais recente é Jorge Coelho, que está a desenhar uma história de Loki, Agent of Asgard.
Este não é, no entanto, o primeiro trabalho de Coelho para a Marvel, uma meta que muitos desenhadores da sua geração perseguem.
Por isso, em entrevista para a preparação deste texto, Jorge Coelho revelou que anda “a mostrar portfólios há já uns anos” até que, “finalmente em Novembro de 2012, no Festival de Lucca, Itália, C.B. Cebulski”, caça-talentos da casa das Ideias o viu e achou que o seu traço “estava no ponto para trabalhar para a Marvel”. “Passaram-se alguns meses” de expectativa, entretanto desenhou “Polarity, para a BOOM! Studios,” e, por fim, foi-lhe proposto “o projecto Venom” que aceitou “sem piscar os olhos”.
Venom #40Venom #40.
“O projecto Venon” era Mania, um arco em três partes escrito por Cullen Bunn, que foi publicado na revista do simbionte, entre os números #40 e #42. Nele foi introduzido o simbionte feminino Mania, que deu nome à história.
Apesar de declarar que não está “completamente satisfeito” com o seu trabalho em Venon, em parte devido a “alguma pressão auto-imposta que deve ter contribuído para tal”, acredita que o resultado influenciou o actual convite para participar em Loki, Agent of Asgard.
Será, então, Jorge Coelho um desenhador com queda para vilões ou será simples coincidência? É o próprio que diz que Loki a seguir a Venon talvez se deva ao facto de “gostar de carregar em negros expressivos” com os quais consegue “transmitir uma atmosfera escura”.
A estes dois projectos, de que tem “gostado bastante”, aponta apenas um senão: “pecam por pequeninos”. E confessa que gostaria, “no futuro, de ter projectos maiores, de habitar títulos e personagens durante mais tempo”.
Sobre aquele que agora o ocupa, menciona que “Loki, Agent of Asgard é uma volta gira ao personagem Loki, depois do Ragnarok, o Apocalipse da mitologia nórdica. Loki morreu e reincarnou no seu próprio corpo, pós-adolescente, em busca de redenção… ou então é apenas mais um dos seus esquemas, quem sabe?”
A história em que está a trabalhar, é “uma espécie de intervalo dentro do principal arco narrativo do título”, e será publicada “em Setembro”, nos números #6 e #7 da revista.
Ainda não pode adiantar muito sobre a narrativa em si, pois apenas recebeu “metade do script”. Neste momento, está a “procurar referências e a tirar as dúvidas normais que surgem durante o processo”. Depois, vai “apresentar layouts que serão comentados” e de seguida ocupar-se-á da arte-final. O processo conclui-se com a “digitalização, uns toques finais em computador e o envio dos ficheiros”. Em suma: “é um processo trabalhoso, mas simples”.
Como sempre que trabalha “tanto em banda desenhada como em ilustração editorial e publicitária, durante a produção” tem sempre de “apresentar esboços e receber de volta alterações. Serem muitas ou poucas depende da equipa e das particularidades do projecto e é mais ou menos imprevisível”.
Se trabalhar para a Marvel dá sempre outra visibilidade, esta é apenas mais uma etapa de um percurso já com alguns anos que, segundo Jorge Coelho “tem sido natural, como desenrolar um novelo. Um trabalho puxa outro, reforça o portfólio e irá trazer melhor trabalho”.
Membro do The Lisbon Studio, costuma comentar com os seus colegas que “publicar não é difícil. Ser pago para tal é onde a porca torce o rabo”. E, no seu trajecto internacional, também tem tido experiências dessas.
O primeiro projecto de maior visibilidade em que participou foi Forgetless, para a Image Comics, uma mini-série em cinco números. Tudo começou com “um repto de Nick Spencer para um conceito de três histórias diferentes que se fundem no último episódio, numa festa” que deu nome à narrativa. “Como a Image Comics, trabalha apenas com percentagem de royalties e o projecto não foi um sucesso de vendas, não rendeu monetariamente”. Mas, neste meio, não é apenas o dinheiro que conta e Coelho assume que Forgetless, já compilado num TPB, “foi o primeiro projecto a dar exposição geral” ao seu trabalho, “o que versus o nada anterior foi um progresso”.
Polarity #1.
Apesar disso, seguiu-se “um hiato, não caiu nenhum trabalho” e acabou por aceitar o convite “para participar no colectivo online Brand New Nostalgia” para o qual teve de executar “cerca de 40 ilustrações em desafios semanais”, que serviu para renovar o seu portfólio e lhe proporcionou uma exposição acrescida, da qual, “certamente, nasceu o contacto de Eric Harburn, da BOOM! Studios”. Dos sucessivos contactos e com pranchas de teste acabou “por conquistar Polarity”, um argumento de Max Bemis, desenvolvido ao longo de quatro comics entre Fevereiro e Maio de 2013, entretanto reunidos num único volume.
Sobre Polarity, Jorge Coelho assegura que “A ideia era muito interessante: Tim um hipster desconsolado descobre que as suas crises bipolares despertaram super-poderes; depois, tudo o que se sucede é estranho”. Algo que lhe agradou, pois gosta “de estranho”. E continua: “o escritor, vocalista da banda Say Anything, trouxe também algum do seu público musical para a banda desenhada, o que contribuiu também para ser um projecto diferente e a todos os níveis bem-sucedido”. Em termos pessoais acredita que conseguiu explorar o seu trabalho “em direcções diferentes do que estava habituado”, o que foi decisivo para “fazer a ponte entre o registo mais europeu e o americano”.
Zero #8.
Entre Venon, datado de Novembro 2013/Janeiro de 2014, e o actual Loki, Agent de Asgard, “do qual ainda não há autorização para revelar imagens” ainda desenhou “o número #10 de Suicide Risk”, escrito por Mike Carey, de novo para a BOOM! Studios – série da qual Filipe Andrade desenhou recentemente o número #14 – e o oitavo Zero, num regresso à Image, um argumento de Ales Kot que considera, “em termos criativos, talvez o projecto mais recompensador até à data…”
E termina, reforçando uma ideia: “Tudo natural, como desenrolar um novelo”.